quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Glifosato Tabelado

No artigo que escrevemos em Agosto/2009 publicado no site do Noticias Agrícolas sob o título Glifosato Antidumping Quem Ganha e Quem Perde, chamamos atenção para as injustificadas retenções das Licenças de Importação do Glifosato que estavam vigorando naquele período (situação que permaneceu até o fim do ano), além da completa ausência de plausibilidade técnica e econômica para a Reserva de Mercado que o Governo bondasamente criou para a Monsanto.

No último semestre de 2009, o DECEX arbitrou esdruxulamente um preço de referência de USD 4,60/kg para as importações do Glifosato Técnico 95% proveniente da China. Destaca-se que a discussão em questão está centrada sobre a matéria prima (sal concentrado) usada nas diluições que geram a formulação mais aplicada no Brasil que é a 480g/litro (36% de Glifosato Ativo).
No mesmo período do ano passado, os preços de exportação do sal concentrado de Glifosato na China oscilaram entre USD 2,60/kg a USD 3,10/kg (base CIF Santos), sobre os quais há que se considerar o Imposto de Importação de 12% e a Tarifa Antidumping de 2,1%.
Devido aos protestos da classe rural, muito bem representada pelo Deputado Luis Carlos Heinze, o Governo reduziu sob muita pressão a estapafurdia tarifa antidumping  de 35,8% que vigorava desde 2003, a pedido da Monsanto, para os atuais 2,1%. 
Para reduzir o impacto de uma nova medida dessa ordem, nossos brilhantes técnicos de Comércio Exterior decidiram ceder aos caprichos da referida multinacional tabelando os preços do Glifosato em USD 4,60/kg para que as importações pudessem ser liberadas em 2009.
Trocando em miúdos, os USD 4,60/kg arbitrados pelo Governo significaram a geração de uma margem líquida compulsória em favor da Monsanto que variou de 48% a 77% no período, levando em conta a variação dos preços de exportação na China, sem contar a incidência do Imposto de Importação e da Tarifa Antidumping.
Nesse cálculo, não se considera a margem comercial da Monsanto na venda do seus produtos formulados.
Tomando como base o valor de referência decidido ontem pela CAMEX de USD 3,60/kg para o Glifosato Técnico, podemos afirmar que o Governo criou uma banda de margem compulsória para a Monsanto, a qual significa a valores de hoje quase 30% de vantagem sobre os produtos chineses, sobre cuja importação, importante frisar, ainda incidem os 12% de II e 2,1% de antidumping que a multinacional não recolhe. Sob outra denominação, na prática se renovou a proteção de mercado a níveis ainda maiores do que antes.
Das atuais 57 formulações de Glifosato registradas no Ministério da Agricultura, 13 pertencem a Monsanto. 
O restante é dividido entre as 18 empresas nomeadas a seguir: Basf, FMC, Milenia, Atanor, Prentiss, Cheminova, Nufarm, Cropchem, Fersol, Nortox, Helm, São Vicente, Sinon, CCAB, Pilarquim, Du Pont, Consagro e Syngenta.
Cabe destacar que algumas das concorrentes da Monsanto acima listadas possuem mais de um registro para a mesma formulação, mas com marca comercial diferente. Demonstrando que os clones se prestam para negociações segmentadas e/ou trocas entre empresas visando a dominação de uma determinada cultura ou região.
Nesse sentido, cabe registrar que as empresas que comercializam o Glifosato genérico se beneficiam enormemente com a elevação do custo de entrada da matéria prima no Brasil, pois é prática comum utilizar o referencial de preços da Monsanto como patamar para formação de preços ligeiramente menores. A nenhum fornecedor interessa vender com um preço baixo ou próximo dos praticados nos países do Mercosul, onde essa bondade com os fornecedores de insumos não foi legalizada. Parece que lá se legisla com lógica e em favor da competitividade da Agricultura.
A dimensão do presente que a CAMEX concedeu ontem a Monsanto e as demais fornecedoras de Glifosato é tão grande que vai resultar em remessa de lucros ao exterior através de operações trianguladas. Pois não cabe dúvida que os chineses continuarão vendendo o Glifosato para os detentores dos registros no Brasil pelo mesmo preço que praticam para outros mercados. É uma Festa!!!
Essa diferença é bem superior aos valores designados pelo Governo para o Seguro Agrícola!
Outro aspecto que cabe registro é a barreira não tarifária que existe no Brasil, a qual fortalece brutalmente a ação das empresas de defensivos agrícolas. Ao invés de flexibilizar a legislação de genéricos e permitir que os agricultores possam importar diretamente os seus insumos, o Ministério da Agricultura, o IBAMA e a ANVISA vem criando embaraços cada vez maiores para o ingresso de novos competidores no mercado, usando como pano de fundo a proteção do meio ambiente e da saúde humana.
Os produtos genéricos mundialmente utilizados estão sendo banidos arbitrariamente para favorecer os protegidos sob patente elaborados pelas multinacionais.
No caso do Glifosato, já estão em curso reavaliações do Governo no sentido de permitir somente o uso de determinados coadjuvantes, os quais, coincidentemente, estão protegidos sob patentes de propriedade das mesmas empresas, ora agraciadas.
A pior conseqüência não está sendo considerada. Se os chineses decidirem representar o Brasil na OMC por conta desse descalabro com o Glifosato, poderão ganhar a causa e nos impor uma pesada retaliação aos produtos do Agro que vendemos para eles.
Todo o esforço de um setor que emprega milhões de pessoas poderá ir para o ralo porque o lobby da Monsanto e das empresas de defensivos agrícolas, no Brasil, são prioridade e tudo podem.
Parafraseando o ilustre Boris Casoy: Isso é uma Vergonha.
Eduardo Lima Porto