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segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

China – Milho versus Soja – Evolução Histórica


Este trabalho é o resumo traduzido e adaptado pela CustodoAgro, do relatório elaborado pela Consultoria DimSums especializada em Economia Agrícola na China.

A China tornou-se uma Economia Agrícola, em torno do binômio Milho-Soja, a exemplo dos Estados Unidos, mas com uma diferença fundamental. Ao invés de realizar a rotação entre os cultivos, os chineses se especializaram na monocultura do Milho, enquanto que quase toda a Soja consumida no País foi sendo substituída pela importação.

O gráfico abaixo demonstra a evolução histórica dos dois cultivos.



A produção de Milho cresceu vertiginosamente desde 1970, ultrapassando o Arroz. Esse crescimento acelerou-se em 2004, quando as autoridades chinesas adotaram Políticas de Fomento, principalmente junto às Províncias do Norte.

A aceleração foi mais rápida entre 2009-2012, quando instituiu-se o Programa de Preços Mínimos (“target price”), voltados para formação de uma reserva temporária sob a justificativa da proteção da “Segurança Alimentar”.

Nos últimos anos, o volume produzido saltou de 110 milhões de toneladas em 2000 para 225 milhões de toneladas em 2015.

Em função da desorganização logística de algumas Províncias, combinada com uma prática de subsídios bastante questionável, verificou-se em 2016 um estoque massivo de Milho com saldos acumulados remanescentes da Safra 2012. 

Entre 2012 e 2016, o Governo Chinês mudou algumas vezes as regras da sua Política de Preços Mínimos, tendo provocado enormes distorções em relação ao Milho Importado.

Na via oposta, a produção de Soja ficou relativamente estagnada durante os últimos anos. Há um fato indiscutível, os Agricultores optaram pelo Milho ao invés da Soja por razões puramente econômicas.

A área de Milho avançou para Terras Altas, substituiu pastagens e invadiu até encostas, empurrando o cultivo para as regiões mais longínquas e frias do Norte.

Entre 2005 e 2015, o incremento da superfície plantada atingiu 11,8 milhões de hectares.

Importante ressaltar que apenas 3 países no Mundo, cultivam mais do que essa extensão (EUA, Brasil e Argentina).

No mesmo período, verificou-se uma redução de 3 milhões de hectares (cerca de 30%) na área que outrora era destinada a Soja.



O implacável crescimento das importações de Soja reflete, à primeira vista, a opção dos Agricultores pelo cultivo do Milho. Entretanto, os fatores que explicam esse espetacular incremento são bem mais amplos e estão diretamente relacionados com a incorporação da proteína animal na dieta de centenas de milhões de chineses.

A primeira importação de Soja ocorreu em 1995.

Em 2016/2017, as estimativas indicam que o volume importado poderá atingir algo entre 87 e 90 milhões de toneladas.

Hipoteticamente, se na área nova, a China houvesse decidido pelo plantio de Soja ao invés do Milho, considerando a produtividade média de 1.700kg/ha, poderia se afirmar que o volume incremental seria de não mais do que 20 milhões de toneladas, equivalendo a menos do que ¼ da quantidade importada atualmente.



Por que escolheram o Milho?

Comparado com a Soja, o Milho produz cerca de 3x mais por hectare. O plantio permitiu que a China atingisse quase que a autossuficiência.

A diferença média entre os rendimentos agronômicos do Milho em relação a Soja aumentou de 189% no ano 2000 para 254% em 2015, de acordo com a pesquisa divulgada pela Comissão de Reforma e Desenvolvimento Nacional.



O gráfico a seguir demonstra a flutuação dos preços do Milho nos últimos anos (base RMB/ton).

 


A produção de Milho foi muito rentável nos últimos anos para os Produtores Chineses. No entanto, os lucros foram diminuindo na medida em que os preços relativos foram caindo.

O aumento nos custos da mão-de-obra no campo (cada vez mais escassa) e o valor crescente dos arrendamentos estão causando desequilíbrios internos. Em suma, está cada vez mais caro e difícil produzir na China.

 

Os insumos agrícolas subiram ao redor de 35% durante o “boom” do Milho. 

O custo da mão-de-obra refletia, no cálculo anterior conduzido pelo Governo, o valor do trabalho familiar que acabava revertendo em Lucro para os pequenos produtores.

Em 2014, o rendimento bruto da produção de Milho caiu fortemente devido a eliminação da Política de Preços Mínimos que dava sustentação para a “reserva temporária”.

Está previsto a implementação de um subsídio para complementar a renda dos produtores. A estimativa é o pagamento de RMB 120,00 por Mu*, compensando em parte o declínio da renda bruta auferida em 2013, época em que os preços atingiram patamares elevados.

·      1 Mu é igual a 666m2 ou 0,066 hectares. A paridade USD-RMB (29/11/16) é de 6,90, nesse sentido o subsídio equivale a USD 260,00/ha.

Tomando como base os preços praticados ontem em Campo Novo dos Parecis/MT (R$ 24,00/sc), o subsídio direto aos produtores chineses de Milho equivale a 53 scs/ha.

Os preços do Milho e da Soja parecem se mover com certo alinhamento na China. Os subsídios para ambas as culturas deverão continuar no limite do “compensatório”.

A maioria dos Analistas prevê uma recuperação modesta para produção de Soja no próximo ano, porém não existe, todavia, um incentivo claro para transferir grandes áreas do Milho para Soja.

Nesse sentido, as Autoridades Chinesas deverão continuar com seus “ajustes estruturais” do lado da oferta, como um mecanismo para reduzir os excedentes de Milho. A instituição da barreira antidumping de 35% sobre o DDGS americano parece confirmar essa premissa.

Muito se comenta de que haveriam milhões de toneladas de Milho deteriorados, sendo que em algumas localidades o problema já teria alçado a categoria de dano ambiental.

Segundo relatos, as Províncias do Norte estariam enfrentando enormes dificuldades para secar e transferir parte do estoque para as Províncias do Sul. Fortes nevascas já atingem a Província de Heilongjiang (principal produtora de Milho e Soja).

Os fabricantes de ração estão aumentando as compras de cereais em razão do maior consumo de carnes no período das Festividades do Ano Novo Lunar.

O fluxo logístico dificultado pelos problemas climáticos tem forçado a formação de estoques maiores do que a média histórica. Essa condição elevou os preços domésticos do cereal, que estaria numa relação de equivalência com o Brasil em algo próximo a R$ 44,00/sc (relação de equivalência) na Província de Heilongjiang e R$ 58,00/sc nos Portos de Guangzhou e Fujian no sul da China.

Em síntese, o cenário de curto-médio prazos indica que a China deverá continuar importando um volume crescente de Soja e priorizando internamente o plantio de culturas que geram um maior volume por unidade de área, como o Milho e a Batata. Esta última, recentemente, passou a ser incentivada devido o alto rendimento agronômico e suas qualidades nutricionais.


terça-feira, 13 de agosto de 2013

O "Trem Bala" da Agricultura é a Internacionalização

Nos últimos dias, tive a oportunidade de visitar novamente o interior de Angola onde fui algumas vezes desde 2009. 

Me surpreendi muito com a evolução verificada na infra-estrutura de locais que há menos de 5 anos eram inacessíveis. O que mais me chamou a atenção foi a intensa presença chinesa, sobretudo pelo fato de lá se encontrar a sua maior construtora e financiadora de projetos internacionais (CITIC Construction).

Essa experiência me motivou a escrever um Artigo, cujo título foi Angola - Futuro Player Agrícola, o qual se encontra postado em destaque no Notícias Agrícolas.

A repercussão do Artigo foi muito grande tendo ocorrido milhares de leituras no site, re-transmissões e re-postagens nas Redes Sociais.

Recebi centenas de emails com opiniões diversas, muitos solicitando informações mais detalhadas sobre as oportunidades citadas.

Naturalmente, fiquei muito Feliz com a dimensão que o assunto tomou.

Em seguida me dei conta de que estamos tomando como "novidade" uma conjuntura que já é realidade de fato. Isso me deixou realmente preocupado.

Quem acompanha de maneira atenta e consciente a evolução do Mundo nos últimos 20 anos, viu entre muitas coisas:

(i) O surgimento da Internet que revolucionou a forma como as pessoas vivem e se comunicam. Tanto é assim que hoje é difícil lembrarmos como fazíamos as coisas antes e não admitimos a hipótese de ficar sem conexão, nem que seja por poucas horas. A mesma situação vale para o Telefone Celular.

(ii) O crescimento impressionante da China que passou rapidamente de um país atrasado para a economia mais sólida do planeta. A transformação superlativa da infra-estrutura chinesa, na forma de Estradas, Ferrovias, Portos e Cidades, não encontra qualquer paralelo na história da humanidade em termos de velocidade e aperfeiçoamento qualitativo. O mesmo se deu em relação a Educação, Geração de Patentes e tantos outros aspectos que designam a diferenciação entre os países no tocante ao desenvolvimento econômico.

(iii) Do início dos anos 90 até os dias de hoje, a prática do Plantio Direto no Brasil cresceu mais do que 30 vezes em superfície cultivada. O cultura da Soja saiu de 9 milhões de hectares para quase 28 milhões. A produtividade média também mais do que duplicou no período. Houve um massivo movimento migratório em direção ao Centro-Oeste, cidades inteiras nasceram onde só havia Mato e Pastagem Degradada. Fortunas se formaram e milhões de empregos diretos e indiretos se consolidaram numa região onde não havia quase nada.

Poderia descrever uma infinidade de outros contextos, produtos e comportamentos que surgiram, desapareceram ou se transformaram nas últimas duas décadas, porém a minha idéia é centrar o foco dessa análise sobre a Agricultura.

Não é preciso chover no molhado para dizer que a infra-estrutura brasileira ficou muito aquém do desenvolvimento que tivemos no Agro. Se compararmos o que construímos e o que a China fez no mesmo período, a diferença fica excessivamente humilhante.

Feita essa rápida contextualização histórica, observei que as opiniões foram variadas sobre a possibilidade de que a Africa se torne produtiva e venha a competir conosco pelo mercado chinês de Soja e Milho.

Alguns críticos da visão exposta no meu Artigo se posicionaram de maneira cética. 

Ouvi comentários bem fundamentados de que a insegurança jurídica em Angola e nos demais países da região permaneceria sendo um entrave ao desenvolvimento de uma Agricultura de escala. Outros manifestaram que a falta de infra-estrutura e conhecimento tecnológico também seriam fatores impeditivos para que viessem a se tornar concorrentes do Brasil.

Existe lógica e coerência em tais entendimentos, mas é preciso rever determinados conceitos e posicioná-los dentro de uma perspectiva mais ampla que nos permita avaliar concretamente as probabilidades a que estamos submetidos.

Me parece que o Brasil está longe de ser um país estável do ponto de vista político-econômico. Tampouco, para nossa desgraça, podemos considerar que o nosso Governo respeita rigorosamente o conceito de propriedade no âmbito de um Estado que se diz "Democrático e de Direito". 

As invasões promovidas pelo MST e pelos indígenas nos mostraram claramente que não somos o lugar mais "seguro" do Mundo para produzir. Se contarmos para um estrangeiro que o desrespeito à Lei é patrocinado por ONG's que são sustentadas com Recursos Públicos, que os atos ilegais não geram qualquer repercussão penal e o que é pior parecem ser incentivados pelo atual Ministro da Justiça, a conclusão óbvia será de que o nosso ambiente não é o mais propício para investimentos de longo prazo.

Remetendo-nos a história recente, muita gente respeitável do Agronegócio Brasileiro duvidou que o Centro-Oeste pudesse vir a se tornar o grande produtor de grãos que é hoje.

Na mesma linha de raciocínio, é possível afirmar que pouquíssima gente no Mundo teria a "Bola de Cristal" tão calibrada a ponto de visualizar com precisão que a China se transformaria na potência econômica e tecnológica que é na atualidade. 

Quem poderia dizer que eles teriam competência para construir centenas de milhares de quilômetros de Estradas e Ferrovias na rapidez e qualidade que fizeram? 

Os Portos chineses se tornaram referencia de classe mundial em termos de eficiência, volume de carga/descarga de granéis e containers, além de serem os de menor custo operacional. Há 20 anos atrás, seguramente, poucos experts no assunto poderiam imaginar a magnitude do que foi construído em tão pouco tempo!

Frente a isso, decidi formular alguns questionamentos reflexivos que compartilho a seguir:

1) A China vem investindo bilhões de dólares há alguns anos em diferentes países africanos, como Angola, Moçambique, Tanzania e Quênia. Segundo estimativas da FAO, a região abaixo do Deserto do Saara possui ao redor de 400 milhões de hectares agricultáveis muito semelhantes ao nosso Cerrado. Considerando que estão implantando uma boa infra-estrutura e contam com as condições naturais que favorecem o cultivo de Soja e Milho, podemos continuar sustentando que a Africa não terá condições de competir conosco?

2) Imaginemos um comprador chinês de grande porte que compre do Brasil mais de 1 milhão de toneladas/ano. Considerando as dificuldades enfrentadas esse ano nos Portos de Paranaguá e Santos, certamente que um cliente assim estará enfrentando prejuízos financeiros e problemas operacionais bastante sérios. Se em poucos anos surgisse uma alternativa de fornecimento mais próxima da China, cujos embarques viessem a ser efetuados em Portos mais eficientes do que os nossos, qual seria a possibilidade do referido comprador diminuir as aquisições no Brasil em favor da nova fonte?

3) Estamos economicamente preparados para perder uma fatia de 10% a 20% das nossas exportações? 

4) Tendo em vista que o Mato Grosso é o principal exportador de Soja e paga o frete mais caro do Mundo da Fazenda ao Porto, qual seria o impacto de uma "eventual" diminuição dos embarques em função do enxugamento da demanda? Os preços no interior continuariam sendo compensadores? 

Não podemos fugir de responder a essas perguntas e a tantas outras que nos permitam melhorar a avaliação dos cenários de curto, médio e longo prazo.

Infelizmente, não temos o mesmo sentido ético de urgência dos chineses e isso aumenta significativamente os nossos Riscos. Nunca nos preocupamos em construir um consenso nacional em torno de um Plano de Desenvolvimento que esteja acima dos interesses político-partidários de curto prazo.

Precisamos no Agro de um Plano de Ação Estratégica totalmente independente do Governo que nos transforme em Exportadores de fato, pois desde sempre temos sido apenas "Comprados" ou meros "Embarcadores"!

Nos Estados Unidos, algumas Cooperativas e Cerealistas de médio porte estão embarcando Soja em containers para a China. Algumas operações envolvem a concessão de prazos de pagamento para os importadores a partir da utilização de mecanismos de Trade Finance de risco mínimo que estão disponíveis no Brasil. 

Já se sabe que determinadas variedades de Soja atendem melhor do que outras à aplicações industriais específicas, o que tem permitido aos produtores americanos a obtenção de prêmios. Possivelmente, alguém deve estar efetuando entregas fracionadas do grão para pequenos e médios consumidores, auferindo melhores margens com a desintermediação do processo.

O que é que estamos fazendo nesse sentido? 

Conhecemos quem são os compradores finais dos nossos produtos agrícolas, quais são as suas necessidades e o que poderíamos fazer para solidificar a nossa posição como fornecedores?

Sabemos a quanto os nossos produtos chegam na última ponta de consumo? Temos alguma estratégia que nos permita melhorar a margem atual?

Não podemos nos iludir mais. A nossa zona de conforto é literalmente efêmera. 

Na minha humilde opinião, devemos iniciar com a máxima urgência um processo de internacionalização das nossas empresas agropecuárias, seja investindo na produção em outros países, seja na organização de estruturas de comercialização que nos coloquem mais próximos do cliente final.

Se continuarmos estagnados, veremos em breve a falência do atual modelo agro-econômico simplesmente porque os nossos Preços não serão mais competitivos. 

Para não sermos atropelados pelo "Trem Bala" da história, temos de construir com a mesma rapidez as competências necessárias para não perder participação nos principais mercados do Agro.

Eduardo Lima Porto

terça-feira, 4 de junho de 2013

Controle da Lagarta Helicoverpa - Custo/Hectare num País Sério


Com a discussão estabelecida nas últimas semanas em torno da liberação da importação do Benzoato de Emamectina para o controle da Lagarta Helicoverpa, decidi conversar com alguns fabricantes chineses que abastecem vários mercados, inclusive algumas multinacionais que operam há anos no Brasil.

Sem exceção, os fornecedores chineses vêm se manifestando com ceticismo em relação a real intenção do Governo Brasileiro de enfrentar o problema da Lagarta, dado o excesso de burocracia e a falta de lógica nos procedimentos exigidos pela Instrução Normativa que supostamente "libera" a importação.

Já alertei, através de um Artigo publicado aqui no Notícias Agrícolas, que não há qualquer menção na referida Instrução Normativa que indique que a Receita Federal irá permitir aos Agricultores, Associações ou Cooperativas fazer a importação sem a existência do RADAR, que é um registro que habilita os operadores do Comércio Exterior.

Sem o RADAR ou um dispositivo jurídico claro que abra o canal aduaneiro para que a importação seja feita, as coisas permanecerão exatamente no mesmo lugar. O Governo fingindo que está sensível ao problema dos Agricultores, os Políticos falando asneiras sobre questões técnicas que desconhecem e os Agricultores se iludindo com uma possível solução, ainda que Divina.

Não bastasse o obstáculo aduaneiro, o setor enfrenta uma burocracia desajeitada, incompetente e que não entende absolutamente nada sobre a logística da Agricultura, do Comércio Exterior e das repercussões gravosas que causam na vida das pessoas que sustentam esse País.

Feitas estas rápidas ponderações, passo a tratar concretamente do tema desse Artigo.

Atualmente, se possível fosse comprar o Benzoato de Emmamectina para o Combate à Lagarta, o Agricultor-Importador estaria pagando ao redor de USD 13,00/kg base CIF Santos por uma formulação com 5% de ingrediente ativo na forma de Grãos Dispersíveis em Água (WDG).

Segundo informações do fabricante consultado, recomenda-se entre 70g e 100g/ha do produto a cada aplicação para o controle da Helicoverpa Armigera e outras lagartas. 

Considerando que estamos tratando de um problema de caráter emergencial cujos danos econômicos são publicamente conhecidos, podemos afirmar que se o Brasil fosse um "País Sério", o custo indicativo por aplicação do Benzoato de Emmamectina giraria em torno de USD 1,30 a USD 1,60/ha.

Infelizmente, é sabido que milhares de Agricultores desembolsaram em vão mais de USD 100,00/ha na última safra e amargaram uma perda Bilionária. Bom que se diga que o prejuízo não foi só do Produtor, mas sim da economia como um todo. 

Existem coisas bem melhores na vida do que gastar mais de R$ 1 bilhão de reais em inseticidas. Imagino que esse dinheiro todo poderia ter sido bem melhor aproveitado nas regiões em que a infestação se deu, entre outros aspectos que é melhor não mencionar.

Interessante que o Brasil é dotado de uma característica sui generis no Mundo. Nos achamos melhores do que os outros em todos os aspectos do conhecimento humano. Não aceitamos que os procedimentos técnicos de países mais avançados sobre-passem o nosso cuidado absoluto na validação da verdade científica (a nossa), principalmente quando o assunto é Defensivo Agrícola ou Medicamento.

Quando se trata de avaliar a viabilidade técnico-econômica de um produto chinês, surgem então inúmeros céticos que afirmam com veemência que não há qualidade e abundam exemplos de toda ordem para sustentar essa posição radical, cuja fragilidade tem sido responsável por equívocos graves e atrasos diversos.

Será que a China como maior produtora, importadora e consumidora de alimentos não possui maturidade e nem capacidade científica para garantir a efetividade dos produtos usados em seu território, os quais são ainda exportados para o mundo inteiro? 

Me indago sobre os demais países, serão todos inferiores aos padrões brasileiros no que se refere aos cuidados com a Saúde e o Meio Ambiente? 

Considerando que somos a fonte do saber nessa área, quais seriam os motivos que levam as Multinacionais, que vendem produtos aqui a preços de "grife", a se abastecerem na China quando precisam de matérias primas ou ingredientes ativos?

Me parece que aqui tudo é possível, principalmente o abuso econômico com a proteção legal do Governo. Exemplos de distorções aberrantes que viram norma, infelizmente não nos faltam.

Vivemos no País em que o Poste mija no Cachorro. 

Merecemos um lugar melhor, do contrário teremos que buscar o caminho descrito no famoso poema de Manoel Bandeira: "Vou me embora pra Pasárgada".

Eduardo Lima Porto

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Glifosato Antidumping – Quem Ganha e Quem Perde

Nos últimos dias, veio à tona a informação de que o DECEX, estranhamente, estaria retendo as Licenças de Importação de Glifosato Técnico e Formulado produzidos na China, sob o pretexto de que os preços declarados estariam muito baixos, requerendo diversas explicações para tal.

O pretexto pode ser o pano de fundo de uma pressão oculta pelo retorno da famigerada tarifa antidumping que transformou o Brasil numa ilha nos últimos anos, possibilitando que a Monsanto reinasse dominante, praticando margens superiores a 200% sobre o custo real de importação desse produto que é considerado commodity e que há muito deixou de ser protegido por patente. 

Como corolário, tal medida do DECEX causa prejuízo imediato e irreparável para toda Agricultura.

O descasamento entre os preços internacionais do Glifosato e a média praticada no Brasil escandaliza. 

O Brasil é um mercado gigantesco e ainda está longe de atingir o consumo potencial de Glifosato.

Entretanto, o Agricultor Brasileiro paga em média 150% mais caro do que o Produtor Argentino ou Paraguaio. 

Se somarmos a tarifa antidumping ao Imposto de Importação que é calculado em cascata, além das outras despesas que incidem sobre o processo, agregando as polpudas margens da Monsanto, fica fácil entender porque essa empresa possui uma das maiores frotas privadas de camionetes cabine-dupla do País, porque os seus executivos estão entre os mais bem pagos do mercado e, consequentemente, porque o Custo desse produto no Brasil é maior do que em outros países, que possuem uma agricultura não tão expressiva.

Durante anos, as importações do Glifosato enfrentaram uma taxação excessiva, em torno de 47,8% (35,8% de antidumping + 12% de imposto de importação), a qual foi reduzida paulatinamente a partir de 2008 para os atuais 14,1%, o que ocorreu somente depois de muita pressão dos Agricultores e da AENDA Associação Brasileira dos Defensivos Genéricos. 

Nessa batalha, a Monsanto seguiu protestando pela  manutenção da barreira tarifária.

A redução do direito adquirido tornou-se impositiva com a crise da oferta mundial de Glifosato em 2007 e parte de 2008, a qual escancarou a incapacidade do Monopólio Monsanto no Brasil de atender ao crescimento da demanda local e internacional.

Como bem apontado pela AENDA, o DECOM definiu a Argentina como país de referência para análise dos preços do Glifosato, desconsiderando a China como principal produtor mundial da molécula sob a alegação de que esse País não seria uma Economia de Mercado.

A definição da Argentina como padrão nesse caso soa tão ridículo quanto avaliar a Suiça como referência na produção de Soja.

Curiosamente, no transcurso do Governo Lula foram realizadas inúmeras viagens à China e celebrados diversos Acordos de grande repercussão que reconheceram o parceiro asiático como sendo uma Economia de Mercado.

Tal situação seria risível, se não fosse trágica, tendo em vista que o Glifosato é um componente relevante no Custo de Produção de inúmeras culturas agrícolas no Brasil.

Produção de Glifosato na China.

A China possui ao redor de 70 fábricas de Glifosato Técnico e mais do que o dobro disso produzindo diferentes formulações do herbicida, inclusive aquelas recentemente introduzidas no Brasil, como a WG.
O Glifosato pode ser fabricado a partir de três diferentes rotas químicas, a saber: 

1) Glicina;

2) Dietanolamina;
3) PMIDA Ácido Fosfonometiliminodiacético.

Os chineses são os maiores produtores mundiais de Glicina, de Fósforo Amarelo, de Tricloreto de Fósforo, de Formaldeído e de PMIDA (principal matéria prima intermediária para produção de Glifosato Técnico). 

Para validar uma medida extrema como a tarifa antidumping, deve-se levar em conta, pelo menos, as particularidades da cadeia de insumos que compõe o produto sob análise.

Matérias Primas do Glifosato na China :

Fósforo Amarelo
A China possui mais de 50 fabricantes registrados e uma capacidade instalada de 1.770.000 ton. O País detém ao redor de 80% da capacidade de produção mundial (dados de 2007).

Tricloreto de Fósforo
Em 2007, haviam 53 fábricas em funcionamento e uma capacidade instalada de 1.300.000 ton.

Dimetil Fosfito
14 fabricantes, totalizando 229.000 ton de capacidade total.

Formaldeído
A China é disparado o maior produtor mundial de Formaldeído, com mais de 400 fábricas em
funcionamento e uma capacidade instalada de 13.000.000 toneladas.

Glicina
O País possuia, em 2007, ao redor de 16 fabricantes de Glicina Grau Técnico, capazes de produzir 316.000 ton/ano.

Dietanolamina - DEA
Apesar de ter importado 76.687 ton em 2007, a China produziu nesse ano ao redor de 7.800 ton de Dietanolamina em 6 fábricas.

PMIDA - Ácido Fosfonometiliminodiacético
Em 2007, havia 41 empresas chinesas produzindo PMIDA. A capacidade instalada no período, conforme as publicações especializadas, dá conta que a China era capaz de produzir 152.000 ton.

Devido ao aumento da demanda, as empresas Anhui Huaxing Chemical e Chonqing Huale Biochemical Co., Ltd declararam estarem incrementando as suas plantas industriais em mais 40.000 ton/ano e 200.000 ton/ano, respectivamente.

Qual País pode ser considerado como de Referência?

Em 2007, a China registrou exportações de PMIDA de 49.401 ton para a Argentina e 8.904 ton para o Brasil.

A demanda brasileira no período foi atendida pelos seguintes exportadores chineses:

Anhui Huaxing Chemical Co., Ltd 324 ton;
Yixing Yinyan Imp. & Exp. Co., Ltd.. 6.620 ton;
Sinochem Jiangsu I & E Co., Ltd 660 ton;
Jiangsu Yinyan Specialty Chemicals.. 1.040 ton;
Shengua Group Holding Co., Ltd.. 210 ton.

Oportuno mencionar que a China apontou em 2007 a Argentina e os Estados Unidos como os principais destinos das exportações de Glifosato Técnico e Formulado, conforme os dados abaixo:

1) Argentina
- Glifosato Formulado 41% IPA 970.000kg Preço Médio FOB USD 2,12/kg;
- Glifosato Formulado 62% IPA 2.050.000kg Preço Médio FOB USD 3,08/kg;
- Glifosato Formulado 75,7% WP 42.400kg Preço Médio FOB USD 6,66/kg;
- Glifosato Técnico 95% - 28.193.450kg Preço Médio FOB USD 4,72/kg
Valor Total Exportado = USD 141.829.511,00 (Base FOB).

2) Estados Unidos
- Glifosato Formulado 41% IPA 9.085.960kg Preço Médio FOB USD 1,95/kg;
- Glifosato Formulado 62% IPA 4.041.440kg Preço Médio FOB USD 2,75/kg;
- Glifosato Técnico 95% - 20.049.710kg Preço Médio FOB USD 4,67/kg
Valor Total Exportado = USD 121.754.932,00 (Base FOB).

Durante o período de 2007, a China exportou (i) 116.616.710kg de Glifosato Técnico; (ii) 72.916.860kg da formulação 41% IPA; (iii) 51.563.640kg da formulação 62% IPA e (iv) 297.050kg da formulação 75,7% WP.

O País exportou um total de USD 842.504.308,00

O destaque para as compras da Argentina e dos Estados Unidos tem por objetivo demonstrar que os nossos principais competidores na produção de grãos buscam na China esse insumo agrícola tão importante.

Revalidação do Antidumping no Brasil

Considerando a cadeia de insumos do Glifosato na China e no Brasil, bem como os aspectos Ambientais envolvidos, nos parecem pertinentes alguns questionamentos a respeito:

Quantas fábricas produzem Glicina no Brasil e qual o volume de produção anual?

Idem para: Dietanolamina, PMIDA Acido Fosfonometil Iminodiacético, Fósforo Amarelo, Tricloreto de Fósforo, Formaldeído, Monoisopropilamina (MIPA) e Fósforo Amarelo.

Nos últimos cinco anos, qual foi o volume de importação da Monsanto para cada um dos itens mencionados acima e os respectivos países de origem?

Qual foi a quantidade de Glifosato Técnico e de PMIDA que a Monsanto importou da sua Matriz nos últimos cinco anos?

Tendo em vista o eventual desconhecimento dos técnicos do Governo sobre a matéria e a possibilidade de que a Argentina tenha sido sugerida como referência, a Monsanto poderia informar se esse País produz os elementos acima relacionados? 

Em caso afirmativo, quem são os fabricantes e quais são as respectivas capacidades produtivas?

Os questionamentos acima não podem ficar sem resposta, já que a Monsanto convenceu o Governo a impôr um pesado custo adicional sobre a importação do Glifosato, o qual onerou e permanece onerando a Agricultura Brasileira.

Estas informações não são de conhecimento generalizado, mas nem por isso significam segredos industriais, haja vista que a molécula em tela já caiu em domínio público há vários anos.

Nesse sentido, as entidades que representam os interesses legítimos dos Agricultores podem e devem cobrar providências efetivas sobre o assunto, tendo o direito inquestionável de conhecer a fundo como se constitui o Custo de Produção do Glifosato.

Afinal de contas, o nosso Custo da Produção Agrícola é amplamente divulgado e conhecido por todos os agentes do agronegócio, principalmente pelas multinacionais de agroquímicos como a Monsanto.

Aspectos Legais

A polêmica envolvendo a questão não se restringe ao território brasileiro.Nos Estados Unidos existem Ações Judiciais Coletivas (Class Actions) que representam milhares de produtores rurais contra a Monsanto, tratando de práticas anti-competitivas, concentração de mercado, margens abusivas entre 300% e 400% e ressarcimento por valores pagos em excesso (Pullen Seeds and Soil versus Monsanto).

Na mesma linha, bastante esclarecedor o material produzido pela Organização The Center for Food Safety, sob o título Monsanto versus U.S. Farmers, o qual pode ser obtido na internet através do link:
(http://www.centerforfoodsafety.org/pubs/CFSMOnsantovsFarmerReport1.13.05.pdf).

A legislação brasileira também dispõem de mecanismos que podem subsidiar o pedido de ressarcimento dos nossos Agricultores, a partir da eventual comprovação de enriquecimento ilícito pela imposição de lucros abusivos.

As margens de lucro abusivas são objeto de prevenção legal desde a época de Aristóteles, tendo motivado a sua descrição em quase todas as legislações.

Permanece atual a Lei 1.521/51, denominada Lei de Crimes contra a Economia Popular que estabelece em seu art. 4°, alínea b, que obter ou estipular, em qualquer contrato, abusando da premente necessidade e INEXPERIÊNCIA da outra parte, lucro patrimonial que exceda o quinto do valor corrente justo da prestação feita ou prometida.

Entende-se por valor corrente aquele constante das cotações oficiais ou obtidos junto às Bolsas de Mercadorias (BM&F, CBOT, etc).

Tendo em vista que os preços do Glifosato não são cotados abertamente em Bolsas de Mercadorias, sendo determinados basicamente no exterior onde se localizam as principais fontes fornecedoras (China), podemos considerar que o mecanismo mais adequado para mensurar os preços correntes é o Método dos Preços Independentes Comparados PIC (Comparable Uncontrolled Price Method CUP).

Referido método que apura os valores correntes é plenamente aceito pela Receita Federal para determinação dos Preços de Transferência e toma por base a média aritmética dos preços dos bens, serviços ou direitos, idênticos ou similares, apurados no mercado brasileiro ou em outros países, em operação de compra e venda sob condições de pagamento semelhantes.

A expressão justo de que trata a Lei significa o valor a ser apurado a partir do somatório dos seguintes fatores, acrescidos de uma margem de 20%, (i) o preço de custo ou valor FOB na origem (mercados relevantes); (ii) o custo do frete; (iii) impostos e despesas adicionais incidentes sobre a transação.

A Lei 1.521/51 estabelece Pena de Detenção de seis meses a dois anos, estendendo seus efeitos aos procuradores, mandatários ou mediadores, prevendo como circunstâncias agravantes do Crime de Usura: (i) ser cometido em época de grave crise econômica; (ii) ocasionar grave dano individual; (iv) quando cometido.(b) em detrimento de operário ou AGRICULTOR, de menor de 18 anos ou de deficiente mental, interditado ou não.

Por fim, a Lei de Crimes contra a Economia Popular determina expressamente que a estipulação de juros ou LUCROS USURÁRIOS será nula, devendo o Juiz ajustá-los à medida legal, ou caso já tenha sido cumprida, ordenar a restituição da quantia já paga em excesso, com juros legais a contar da data do pagamento indevido.

A Constituição Federal de 1988 não foi omissa nesse aspecto, pois determinou no art. 173, parágrafos 4° e 5°, que a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, a eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.

Já a Lei 8.884/94, também chamada Lei Antitruste, destaca no art. 20, parágrafo 2°, que ocorre posição dominante quando uma empresa ou grupo de empresas controla parcela substancial de mercado relevante, como fornecedor, intermediário, adquirente ou financiador de um produto, serviço ou tecnologia a ele relativa.

O parágrafo 3° do mesmo artigo dispõe que a parcela de mercado referida no parágrafo anterior é presumido como sendo da ordem de 30% (trinta por cento).

Nesse sentido, cabe transcrever ainda o artigo 21, parágrafo único: na caracterização da imposição de preços excessivos ou do aumento injustificado de preços, além de outras circunstâncias econômicas e mercadológicas relevantes, considerar-se-á: (); III o preço dos produtos e serviços similares, ou sua evolução, em mercados competitivos comparáveis; IV a existência de ajuste ou acordo, sob qualquer forma, que resulte em majoração de bem ou serviço ou dos respectivos custos.

Conforme o entendimento legal e a mais ampla Jurisprudência, para que o lucro se torne inconstitucional, basta que ele resulte de uma situação sobre a qual o detentor do meio de produção possua condição de força.

Será o caso?

Nessa esteira, cabe exortar às autoridades competentes (DECOM, DECEX, Ministério da Agricultura e Secretaria de Direito Econômico) a que prestem mais atenção, já que a sua existência subordina-se exclusivamente ao interesse da Sociedade Brasileira e não a de um Monopólio Privado, não importa se de capital nacional ou estrangeiro.

Aprovar a volta do antidumping sobre o Glifosato Chinês é o mesmo que aceitar reclamação semelhante de um Suíço que planta Soja nos Alpes contra um Agricultor Brasileiro.

Eduardo Lima Porto