segunda-feira, 22 de julho de 2013

Angola - Futuro Player Agrícola?

Cheguei a Angola há alguns dias com o propósito de visitar algumas fazendas e revendedores de insumos agrícolas.

Conheço razoavelmente bem o interior desse país, que durante muitos anos sofreu com uma sangrenta Guerra Civil, a qual foi definitivamente resolvida em 2002. De lá para cá, Angola vem crescendo a taxas impressionantes. 

Desde a primeira vez em que estive por aqui, me chamou muito a atenção a similaridade que o Planalto Angolano possui com o Cerrado Brasileiro, em termos de Solo, Clima, Regime Pluviométrico e Vegetação. O País é ainda contemplado por 3 bacias hidrográficas bastante caudalosas que favorecem o estabelecimento de extensas áreas irrigáveis.

Segundo dados da FAO, Angola possui ao redor de 45 milhões de hectares aptos à Agricultura e aproveita não mais do que 2 milhões de hectares de forma predominantemente rudimentar.

No passado, o País chegou a ser o quarto maior produtor mundial de Café e foi auto-suficiente na produção de Milho.

Atualmente, Angola importa quase que a totalidade dos alimentos que consome. A produtividade agrícola é ainda muito baixa quando comparada aos principais países produtores. O rendimento médio do Milho situa-se na faixa de 800kg/ha.

As razões dessa situação estão relacionadas com a Guerra Civil que durou mais de 30 anos. A infra-estrutura agrária foi praticamente destruída, centenas de milhares de agricultores morreram e houve um massivo êxodo em direção as zonas urbanas de Luanda (capital) e Benguela (segunda cidade mais importante).

A transmissão do conhecimento entre as gerações foi interrompido, sendo esse aspecto, na minha opinião, um dos maiores entraves para que os jovens que migraram se sintam estimulados a retornar ao interior para dedicarem-se a atividade rural.

Conseqüência disso, os preços internos dos alimentos em Angola são extremamente elevados em comparação aos praticados no Brasil. Para se ter uma idéia, o Milho há poucos dias atrás estava sendo vendido a um valor equivalente a R$ 65,00 o saco de 60kg. A batata inglesa, aqui chamada de "batata rena", custava entre USD 2,00 a USD 3,00 por kg.

Por esse motivo que o Governo Angolano está empreendendo esforços no sentido de recuperar rapidamente a produção agrícola, com um claro propósito de diversificar a economia e reduzir a dependência quase que absoluta que o País possui em relação ao Petróleo. 

Com a estabilidade político-institucional alcançada após 2002, a China tornou-se o principal parceiro comercial de Angola a partir da construção e financiamento de obras de infra-estrutura de grande porte, cujo pagamento envolve contratos de bilhões de dólares denominados em embarques de Petróleo.

A presença chinesa em Angola é vista por todos os lugares e muitos trabalhadores da construção civil já conseguem se comunicar em português, o que mostra uma velocidade de aprendizado e adaptação cultural surpreendentes.

Não vai demorar muito para que os chineses comecem a produzir e exportar Soja e Milho em grande escala, não só em Angola, mas também em outros países do continente africano que possuem condições semelhantes ao nosso Cerrado.

Iniciativas bem estruturadas já estão sendo conduzidas em Angola para atrair Investidores Agrícolas. É o caso da SODEPAC - Sociedade de Desenvolvimento do Pólo-Agroindustrial do Capanda (www.sodepac.com).

Fui convidado essa semana, junto com investidores e técnicos vindos de inúmeros países, a visitar o Pólo Agro-Industrial do CAPANDA localizado na Província do Malange (norte de Angola).

Trata-se de um empreendimento composto de 411.000 hectares, dos quais 293.000 se destinam a produção agrícola com foco em Milho e Soja.

Nessa área, a Odebrecht já está cultivando Cana em sociedade com a Sonangol (empresa estatal de Petróleo). Uma Usina de grande porte está sendo terminada e irá produzir ao redor de 300.000 toneladas/ano de Açúcar, além de Etanol e Energia Elétrica.

A Odebrecht é a principal empresa estrangeira em Angola, emprega mais de 30.000 pessoas no País e atua em diversos segmentos. 

No evento que participamos, a empresa anunciou um investimento de mais de USD 250 milhões na implantação de um Complexo totalmente verticalizado de produção de Aves e Suínos, o qual terá como suporte o cultivo próprio de Soja e Milho numa extensão que deverá superar inicialmente os 50.000ha.

A empresa firmou um contrato de assistência técnica e planejamento organizacional com a SODEPAC, sendo a responsável pela avaliação de projetos e seleção de investidores interessados em se instalar na região.

Visitamos também a Fazenda Pedras Pretas administrada de maneira compartilhada entre a empresa pública angolana Gesterra e a chinesa CITIC Construction, que foi a responsável pela abertura de 10.000ha, a construção dos canais de irrigação (pivots), armazenagem, etc.

A CITIC Construction é outra grande investidora em Angola a exemplo da Odebrecht. Possui diversos projetos em implantação no País e tem um contrato com o Governo Angolano para explorar 500.000 hectares. A lógica aponta que o objetivo é atender a demanda chinesa.

Sem dúvida que a China está trabalhando fortemente para reduzir a dependência em relação aos fornecedores tradicionais. Os chineses estão sendo muito inteligentes, pois estão aproveitando as necessidades dos países africanos em termos de infra-estrutura para consolidar posições estratégicas com a obtenção de vastas porções de terra. Angola demonstra ser um exemplo claro dessa estratégia. 

A China já faz "barter" de Obras por Petróleo e Terras há tempos na Africa. Trocar Estradas e Portos por Soja está longe de ser improvável.

Produzir cereais em Angola é extremamente atrativo para qualquer empresa agrícola. É algo como produzir no Mato Grosso ou Goiás, estando a uma distância equivalente a de Ponta Grossa em relação ao Porto de Paranaguá.

Aos investidores estrangeiros se oferece a concessão das terras por um período de 25 anos, renovável por outros 25. As terras pertencem ao Estado, não havendo compra e venda na forma como estamos acostumados no Brasil. 

Produtores tradicionais que tenham uma orientação excessivamente "patrimonialista" em relação a terra não deverão se estimular a investir em Angola ou em outros países africanos.

Angola é uma excelente oportunidade para empresários rurais que buscam ganhos de escala com a incorporação de novas áreas. É o local perfeito para os Desbravadores Profissionais.

A segurança jurídica dos investimentos está alicerçada na Constituição do País, a qual está alinhada com acordos internacionais que visam assegurar a proteção da propriedade. Reitero que o termo "propriedade" nesse caso está relacionado com as benfeitorias realizadas sobre a terra.

Adicionalmente, me parece que é recomendável a contratação de uma Apólice de Seguro através do MIGA - Multilateral Investment Guarantee Agency (braço segurador do Banco Mundial) que possibilita a proteção dos investimentos a partir da mitigação de uma série de riscos, como desapropriações, conflitos civis, crises econômicas que impeçam a remessa de pagamentos ao exterior, entre outros. 

Angola se encontra no rol dos países africanos que estão cobertos pelas Apólices do Banco Mundial.

A tendência é clara e demonstra que haverá nos próximos anos um forte deslocamento dos grandes players agrícolas para países como Angola, tendo em vista que: (i) não há necessidade de investir na compra de terras; (ii) existe a infra-estrutura logística para escoar a produção; (iii) os custos relativos são inferiores aos do Brasil, inclusive no que se refere as linhas de financiamento disponíveis.

Um dos componentes de custo que mais me chamaram a atenção foi o Diesel, que no interior de Angola é vendido por um valor equivalente a R$ 0,50/litro.

Considerando que é possível importar insumos e máquinas agrícolas diretamente, que as zonas de cultivo fazem parte de um amplo programa de isenção fiscal, pode-se afirmar que os custos dos fatores de produção venham a ser de 30% a 50% inferiores aos do Brasil.

Entretanto, alguns desafios importantes deverão ser superados em Angola, sendo, talvez um dos principais, a capacitação da mão-de-obra local para operação de máquinas e implementos e a formação de uma cadeia de fornecimento de insumos e serviços nos moldes conhecidos no Brasil.

Segundo comentários ouvidos no evento da SODEPAC, a EMBRAPA estaria prestes a instalar uma Unidade na Província do Malange para dar suporte técnico aos empreendimentos que se instalarão na região.

De acordo com o Secretário de Estado da Agricultura - Eng. Agr. José Amaro Tati, o modelo adotado pela SODEPAC deverá ser replicado em outras Províncias do País que possuem aptidão agrícola. A julgar pela rapidez com que esse Projeto está sendo implementado, me parece que o empenho nesse sentido é realmente sério.

Amaro Tati, apesar do senso de humor que o torna uma figura muito simpática a todos, não brinca em serviço quando se trata de Agricultura. Ele conhece profundamente a realidade da produção brasileira. Tive a oportunidade de acompanhá-lo em duas ocasiões no Brasil e no Paraguai em visita a agricultores que são referencia em termos de produtividade de Soja e Milho.

A SODEPAC está sendo gerida por técnicos capacitados que demonstraram saber exatamente o que querem e como fazer para que o Projeto se torne uma realidade. O Presidente da Empresa é o Engenheiro Agrônomo Carlos Fernandes, que no passado foi Ministro da Agricultura de Angola.

Pelo que vi, Angola está priorizando a produção de Milho e Soja como meio para viabilizar a instalação de grandes industrias processadoras de proteínas de ciclo rápido (Aves, Suinos e Peixes).

Há também um enorme interesse de atrair Pecuaristas brasileiros, mas o País se ressente da falta de matrizes, sendo necessária a importação de uma grande quantidade de animais para formação dos rebanhos. 

A Segurança Alimentar está realmente sendo tratada como questão estratégica pelo Estado.

O mercado externo deverá ser o próximo passo. A presença massiva dos chineses na região indica claramente que essa tendência é sólida. 

Falta apenas a construção de um Porto graneleiro com capacidade para movimentar navios de grande porte, o que definitivamente não será problema para os chineses, tendo em vista o know how que possuem nessa matéria, a existência de uma malha ferroviária moderna e boas estradas que, diga-se de passagem, causam inveja as nossas no Mato Grosso.

Parece que os Angolanos estão tirando lições valiosas da nossa incompetência quando o assunto é infra-estrutura para o escoamento da produção. Por outro lado, estão aproveitando muito bem os nossos bons exemplos e já viram que o Brasil se tornou uma potência econômica que é hoje devido a força do Agronegócio.

Há tempos que afirmo que não tardará muito para que o tabuleiro mundial da produção de alimentos mude com a inserção ativa do continente africano. Saio de Angola novamente com essa convicção ainda mais fortalecida. 

Eduardo Lima Porto

terça-feira, 4 de junho de 2013

Controle da Lagarta Helicoverpa - Custo/Hectare num País Sério


Com a discussão estabelecida nas últimas semanas em torno da liberação da importação do Benzoato de Emamectina para o controle da Lagarta Helicoverpa, decidi conversar com alguns fabricantes chineses que abastecem vários mercados, inclusive algumas multinacionais que operam há anos no Brasil.

Sem exceção, os fornecedores chineses vêm se manifestando com ceticismo em relação a real intenção do Governo Brasileiro de enfrentar o problema da Lagarta, dado o excesso de burocracia e a falta de lógica nos procedimentos exigidos pela Instrução Normativa que supostamente "libera" a importação.

Já alertei, através de um Artigo publicado aqui no Notícias Agrícolas, que não há qualquer menção na referida Instrução Normativa que indique que a Receita Federal irá permitir aos Agricultores, Associações ou Cooperativas fazer a importação sem a existência do RADAR, que é um registro que habilita os operadores do Comércio Exterior.

Sem o RADAR ou um dispositivo jurídico claro que abra o canal aduaneiro para que a importação seja feita, as coisas permanecerão exatamente no mesmo lugar. O Governo fingindo que está sensível ao problema dos Agricultores, os Políticos falando asneiras sobre questões técnicas que desconhecem e os Agricultores se iludindo com uma possível solução, ainda que Divina.

Não bastasse o obstáculo aduaneiro, o setor enfrenta uma burocracia desajeitada, incompetente e que não entende absolutamente nada sobre a logística da Agricultura, do Comércio Exterior e das repercussões gravosas que causam na vida das pessoas que sustentam esse País.

Feitas estas rápidas ponderações, passo a tratar concretamente do tema desse Artigo.

Atualmente, se possível fosse comprar o Benzoato de Emmamectina para o Combate à Lagarta, o Agricultor-Importador estaria pagando ao redor de USD 13,00/kg base CIF Santos por uma formulação com 5% de ingrediente ativo na forma de Grãos Dispersíveis em Água (WDG).

Segundo informações do fabricante consultado, recomenda-se entre 70g e 100g/ha do produto a cada aplicação para o controle da Helicoverpa Armigera e outras lagartas. 

Considerando que estamos tratando de um problema de caráter emergencial cujos danos econômicos são publicamente conhecidos, podemos afirmar que se o Brasil fosse um "País Sério", o custo indicativo por aplicação do Benzoato de Emmamectina giraria em torno de USD 1,30 a USD 1,60/ha.

Infelizmente, é sabido que milhares de Agricultores desembolsaram em vão mais de USD 100,00/ha na última safra e amargaram uma perda Bilionária. Bom que se diga que o prejuízo não foi só do Produtor, mas sim da economia como um todo. 

Existem coisas bem melhores na vida do que gastar mais de R$ 1 bilhão de reais em inseticidas. Imagino que esse dinheiro todo poderia ter sido bem melhor aproveitado nas regiões em que a infestação se deu, entre outros aspectos que é melhor não mencionar.

Interessante que o Brasil é dotado de uma característica sui generis no Mundo. Nos achamos melhores do que os outros em todos os aspectos do conhecimento humano. Não aceitamos que os procedimentos técnicos de países mais avançados sobre-passem o nosso cuidado absoluto na validação da verdade científica (a nossa), principalmente quando o assunto é Defensivo Agrícola ou Medicamento.

Quando se trata de avaliar a viabilidade técnico-econômica de um produto chinês, surgem então inúmeros céticos que afirmam com veemência que não há qualidade e abundam exemplos de toda ordem para sustentar essa posição radical, cuja fragilidade tem sido responsável por equívocos graves e atrasos diversos.

Será que a China como maior produtora, importadora e consumidora de alimentos não possui maturidade e nem capacidade científica para garantir a efetividade dos produtos usados em seu território, os quais são ainda exportados para o mundo inteiro? 

Me indago sobre os demais países, serão todos inferiores aos padrões brasileiros no que se refere aos cuidados com a Saúde e o Meio Ambiente? 

Considerando que somos a fonte do saber nessa área, quais seriam os motivos que levam as Multinacionais, que vendem produtos aqui a preços de "grife", a se abastecerem na China quando precisam de matérias primas ou ingredientes ativos?

Me parece que aqui tudo é possível, principalmente o abuso econômico com a proteção legal do Governo. Exemplos de distorções aberrantes que viram norma, infelizmente não nos faltam.

Vivemos no País em que o Poste mija no Cachorro. 

Merecemos um lugar melhor, do contrário teremos que buscar o caminho descrito no famoso poema de Manoel Bandeira: "Vou me embora pra Pasárgada".

Eduardo Lima Porto

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Mega-Fusão do Agro: Sociedade entre a Lagarta e a Mosca Branca

Muita gente ainda não se deu conta, mas o Governo está fomentando explicitamente uma Mega-Fusão de alcance multi-bilionário. Trata-se da Sociedade entre a Lagarta Helicoverpa e a Mosca Branca, cujo avanço sobre a Agricultura superará qualquer indicador de performance conhecido. Nada se compara em termos de capacidade de crescimento, resistência competitiva e influência financeira. 
Ao contrário do que ocorre nos países "neoliberais", essa Sociedade não foi concebida por um ou dois Gênios da TI ou por Operadores do Mercado Financeiro. Nunca antes na história desse País, foi possível reunir e potencializar o labor de centenas de milhões de indivíduos (Lagartas e Moscas). 
O Brasil foi considerado o País ideal para que a nova Fusão ganhe escala e venha a se tornar suficientemente forte para dominar vários outros mercados. E isso se dará muito rápido, já na próxima Safra de Verão.
Opositores, se é que os Senhores realmente existem, tenham por favor a dignidade de reconhecer que se não fosse por esse Governo, a "Sociedade" entre a Helicoverpa e a Mosca Branca dificilmente atingiria uma dimensão tão importante em termos econômicos.
Ressalvando apenas algumas diferenças de procedimento, a referida Fusão está sendo fomentada nos mesmos moldes que nortearam outras operações de destaque nos últimos anos, como as conduzidas pelo BNDES na área dos Frigoríficos, do Petróleo, Empreiteiras e outros setores considerados estratégicos pela inteligência superior dos nossos dirigentes.
A captura de bilhões de reais da economia agrícola é o objetivo que se persegue. Nada poderá impedir a legitimidade da ação massiva e transversal das milhões de Lagartas e Moscas-Brancas que vinham sendo excluídas pela Elite do Agro.
A Lagarta e a Mosca Branca ajudarão o Governo no sentido de acelerar o êxodo rural, a transferencia de extensas áreas em favor dos Índios e "Companheiros" que notadamente são mais competentes para conduzir a Agricultura.
Enfim, os benefícios serão imensamente superiores aos custos e eventuais danos colaterais que são parte do processo de transformação revolucionária desejado.
Algumas ações já em curso deverão ser reforçadas pelo Governo a fim de blindar a Fusão:
1) Impedir a importação direta de defensivos agrícolas, o que permitirá que os preços continuem muito elevados visando a proteção dos interesses dos "fabricantes locais";
2) Manter absolutamente inalterada a legislação vigente e o atual ritmo de liberação dos registros;
3) Editar Instruções Normativas contraditórias e totalmente desprovidas de fundamento prático de forma a desorientar temporariamente os Grupos não-alinhados;
4) Incrementar as exigências fiscais e ambientais para qualquer um que deseje conter o avanço das Companheiras Lagartas e Moscas-Brancas;
5) Seguir rigorosamente o Plano traçado no Foro de São Paulo.

Se o Governo permanecer firme nesse propósito e continuar contando com a postura leniente do Agro, o sucesso da Fusão Societária estará garantido e será irreversível.
Eduardo Lima Porto

sexta-feira, 19 de abril de 2013

A Logística da Lagarta e os Atos Inúteis

Esperei alguns dias para avaliar em profundidade a Instrução Normativa do MAPA que anunciou a "permissão" para que produtores possam importar diretamente o Benzoato de Emamectina, supostamente, o único princípio ativo capaz de controlar a Lagarta Helicoverpa armigera.

Novamente, o Governo editou uma medida absolutamente inútil. 

Às vezes me pergunto se essa inutilidade continuada é proposital ou é fruto da mais pura e concentrada incompetência.

Na prática, infelizmente, a situação emergencial tende a se agravar porque em termos burocráticos não houve nenhuma mudança concreta.

Vejamos o que diz a Instrução Normativa:

Art. 2º O interessado deverá apresentar Solicitação de Autorização de Importação no setor competente da Superintendência Federal de Agricultura, Pecuária e Abastecimento - SFA, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA, da Unidade da Federação, instruído com os seguintes documentos:

I - termo de autorização de aplicação emitido pelo Órgão Estadual de Defesa Agropecuária conforme Anexo desta Instrução Normativa; e

II - cópia do Licenciamento de Importação (LI).

§1º O interessado deverá incluir em campo próprio do LI a observação de que se trata de produto para aplicação emergencial e o número do Termo de Autorização emitido pelo órgão estadual de defesa agropecuária, nos termos da Instrução Normativa nº 13, de 2013.

§2º Para efeito de registro do LI, o produto deverá ser enquadrado na NCM 3808.9199.

Art. 3º Para os efeitos desta Instrução Normativa não será exigido do interessado registro de produto junto ao MAPA.

Na média, o produtor brasileiro, mesmo o de grande porte, não tem experiência de Importação. Na mesma condição se encontram a maior parte das Cooperativas Agrícolas. 

Não se trata de incompetência do setor, muito pelo contrário. Vivemos há anos submetidos a regras esdrúxulas que são típicas de países comunistas, onde o Governo nos dita tudo o que podemos ou não fazer, o que se pode ou não comprar, etc.

O Brasil é um dos países mais complicados e burocráticos do Mundo quando se trata de finalizar uma Importação, sendo uma verdadeira incógnita até para operadores experientes saber qual será o custo final de um produto importado. Aqui não estou nem falando do tempo de liberação de uma carga.

Obrigatoriamente, o Importador Brasileiro precisa estar inscrito junto a Receita Federal para obter um registro específico chamado RADAR. 

As compras no exterior ficam limitadas no primeiro ano a USD 150.000,00 por semestre, independentemente do porte do solicitante. A concessão dessa autorização normalmente demora meses e implica no atendimento de uma série de requisitos que a imensa maioria dos Agricultores-Pessoa Física não têm condições de cumprir.

Não vi em nenhum lugar que a Receita Federal irá abrir precedente para liberar a importação dos produtores, cooperativas e associações que não possuam o RADAR. Alguém viu isso ou tem a confirmação oficial de que não haverá a necessidade desse registro?

Sem que essa questão esteja 100% esclarecida, de nada servirá a Instrução Normativa. Enquanto o MAPA dirá de um lado que "sim", do outro a Receita Federal dirá que não. 

A liberação deve ser efetiva. Deve contemplar toda a logística documental e as dificuldades que são inerentes ao processo.

Infelizmente, exemplos de medidas governamentais contraditórias não faltam em relação a Agricultura.

Em 25 de março de 2010, o Ministério da Industria e Comércio junto com a Receita Federal anunciaram, através da Portaria 467, o "Drawback Agropecuário", cujo objetivo era a redução dos custos de produção para os Exportadores do Agronegócio a partir da isenção tributária nas importações de Fertilizantes, Defensivos Agrícolas e Medicamentos Veterinários".

Entretanto, não é possível importar qualquer tipo de Defensivo Agrícola "Genérico" sem que o interessado seja o dententor ou titular do "registro" da molécula. Como o registro custa mais do que USD 300.000,00 e demora em média 7 anos para ser aprovado, para quê serviu o tal "Drawback Agropecuário"?

Voltando a análise da Instrução Normativa, cabem ainda outras considerações:

Art. 3º Os produtos importados serão aplicados sob controle da autoridade fitossanitária estadual e supervisão da Secretaria de Defesa Agropecuária, para controlar a emergência declarada.

Quem assinou a liberação do Benzoato de Emamectina, ao que tudo indica, parece desconhecer que o Ministério da Agricultura está completamente sucateado em sua estrutura, que faltam técnicos e fiscais em todos os setores. 

O que se pode esperar então das Secretarias Estaduais de Agricultura pelo Brasil afora. Não vou nem falar das prerrogativas e interpretações, muitas vezes de caráter ideológico, que cada Fiscal poderá ter no momento de decidir sobre a sua agenda para acompanhar a aplicação do produto.

Tudo se resume a Logística! Não temos logística de transporte, não temos logística de fiscalização, não temos logística documental, não temos sequer uma legislação coerente com a realidade. 

A Lagarta não vai esperar pela agenda dos Órgãos de Fiscalização. A Logística da Lagarta é muito mais eficiente. Na "cabeça" da Lagarta, a meta é comer e procriar. A burocracia não importa na Vida da Helicoverpa.

Ressalto que não estou criticando de maneira generalizada a categoria dos Fiscais, muito pelo contrário. A maior parte dos profissionais que conheço atuam como verdadeiros consultores de qualidade e contribuem em vários aspectos para o sucesso da atividade agropecuária. 

Minha crítica vai para os pseudo-técnicos que se encontram em posições de Chefia, apenas por serem da "confiança" de Políticos de última categoria. 

A efetividade dessa Instrução Normativa está condicionada aos seguintes pontos:

1) Que os Agricultores, Cooperativas, Associações e Revendas de Insumos possam fazer a importação direta sem a exigência do RADAR e quando a mercadoria chegar nos Portos que seja imediatamente liberada ("canal livre");

2) Que as Revendas de Insumos possam atuar na comercialização para os pequenos e médios produtores, garantindo através do Receituário Agronômico a rastreabilidade integral do uso do produto;

Se esses aspectos não forem levados em conta, a Lagarta continuará ganhando a corrida, dizimando milhões de hectares e causando um prejuízo bilionário ao País.

Eduardo Lima Porto

quarta-feira, 27 de março de 2013

China e Brasil - Parceria em Infraestrutura?

Os inúmeros projetos de infraestrutura que a China vem financiando nos últimos anos mundo afora são fruto de um Programa de longo prazo voltado para o fomento das exportações de bens de capital, serviços e geração de empregos naquele País. 

Com admirável visão estratégica e competência técnica, as construtoras chinesas têm dado um show em matéria de eficiência, cumprimento de cronogramas e principalmente gestão de custos.

Exemplo disso foi a construção da maior ponte do Mundo na Bacia de Jiaozhou, que liga a importante cidade portuária de Qingdao (capital da Provincia de Shandong) com a ilha de Huangdao. Em agosto de 2011, tive o prazer de percorrer os 42km dessa obra colossal, projetada em tempo recorde e construída para durar décadas. 

Na mesma época, a Presidente Dilma anunciava, com toda a pompa, a liberação de verbas para a construção de uma nova ponte sobre o estuário do Guaíba em Porto Alegre com uma extensão de aproximadamente 2,9km, cujo projeto aprovado pelo DNIT previa um investimento similar ao que foi feito para construir a maior obra do gênero no Mundo. 

A diferença entre essas duas obras não é só escandalosa sob os mais variados ângulos. Nos indica claramente que a evolução da infraestrutura no Brasil está condenada a roubalheira, ao descumprimento dos prazos de entrega e a uma qualidade mais do que duvidosa. 

Não tenho esperança que haja inteligência, vontade firme e muito menos decência no Brasil para que possamos aproveitar a oportunidade que outros países estão tendo em relação às obras financiadas pelo Governo Chinês. 

No Brasil, desgraçadamente, nunca será possível evoluirmos sobre as mesmas bases. Desejaria realmente estar enganado em relação a isso, porém, infelizmente, meu pessimismo está fundado em alicerces muito sólidos. 

A China não irá liberar dinheiro para que o Brasil construa do seu jeito a infraestrutura que nos falta. Muito pelo contrário. É impensável que venham a disponibilizar bilhões de dólares para que os nossos políticos enriqueçam às expensas do Povo Chinês como fazem por aqui. 

O Chinese Eximbank exige a participação majoritária de construtoras chinesas nos projetos, bem como o envolvimento pleno dos seus Engenheiros, Técnicos e Obreiros, além de máquinas e equipamentos produzidos na China. E não poderia ser diferente. 

Não há nada no Brasil que se compare em termos de qualidade e capacidade técnica com as construtoras chinesas. Estamos décadas atrasados em relação a eles.

Para nossa desgraça, os políticos brasileiros nunca permitirão que as nossas empreiteiras venham a perder espaço para concorrentes estrangeiros, mesmo que as vantagens econômicas sejam indiscutíveis.

E a razão é muito simples. Qual o Partido Político que não está ou que nunca esteve envolvido em algum tipo de falcatrua ou desvio de dinheiro público em parceria com as empreiteiras brasileiras? Quem é que não tem o rabo preso? 

O lobby nunca permitirá que o SUPERFATURAMENTO fique escancarado ante a mera comparação com a concorrência. 

Ainda que assim não fosse, o que admito apenas por amor ao debate, certamente surgiriam inúmeros grupos de interesse que impediriam a modernização da infraestrutura no Brasil. 

Não faltariam Sindicatos, Movimentos Sociais e Conselhos Profissionais a defender a soberania nacional, isonomias, direitos adquiridos e tantas outras questões vergonhosas que fazem parte do nosso arcabouço institucional e que nos condena a mais rotunda mediocridade em termos de desenvolvimento econômico e social.

Enquanto na China o desvio de dinheiro público é considerado Crime Hediondo, passível de Pena de Morte. Por aqui é motivo de Pizza, vide o resultado da CPI do Cachoeira e o abafamento dos negócios envolvendo a Construtora Delta. 

É por isso que estou pessimista em relação ao nosso futuro e não acredito em nada que possa vir a mudar as condições precárias que já nos encontramos. 

Acredito que não tardará muito tempo para que o Brasil tenha a sua importância relativizada como fornecedor de grãos no tabuleiro internacional, já que a China vem investindo bilhões de dólares nos últimos anos no Continente Africano, onde existe ao redor de 400 milhões de hectares de Cerrado disponíveis. Claro está que o objetivo de longo prazo do Governo Chinês é a Segurança Alimentar do seu Povo.

Pensar que os chineses irão permanecer indefinidamente dependentes do Brasil em relação a Soja é muita ingenuidade e uma demonstração de torpeza estratégica. 

Aqueles que acham que a China vai nos dar dinheiro fácil para construir Portos, Ferrovias e Estradas à troco de Soja, Minério ou Banana, são os mesmos que nos levaram ao caos logístico que nos encontramos.

Eduardo Lima Porto


quinta-feira, 12 de abril de 2012

Produzir Arroz = Prejuízo? Parte II - Mercosul e Agenda Positiva

Dando seqüência ao Artigo que publiquei na semana passada (http://www.noticiasagricolas.com.br/artigos/artigos-geral/104099-produzir-arroz--prejuizor.html), no qual foram abordadas as distorções históricas atribuídas sobre o Custo Real de Produção do Arroz, tratarei agora de analisar com mais detalhe a questão das Importações do Mercosul e ao final deixo um conjunto de sugestões para a construção de uma Agenda Positiva.

Como o Lobby é muito forte e a lamúria é antiga, conseguiram articular junto a Assembléia Legislativa do RS a criação de uma CPI do Arroz, a qual tem manifestado publicamente que o objetivo é responsabilizar o Mercosul pela "Eterna Crise" do Setor, apontando também como vilões as industrias beneficiadoras e a carga tributária incidente sobre a comercialização.

Conforme mencionado, os Custos Nominais de Produção do Arroz no Mercosul são menores do que no Brasil em razão da diferença dos preços dos Defensivos, do Diesel, dos Juros de Mercado serem menores do que os nossos, entre outros aspectos.

Nesse sentido, é uma total falta de Moralidade acusarmos os Vizinhos do Mercosul de "Concorrência Desleal" na produção de Arroz.

O mais certo seria buscar os motivos pelos quais eles conseguem produzir mais a custos menores e corrigirmos a nossa ineficiência.

Entretanto, isso parece não interessar ao Lobby e nem aos Políticos que estão envolvidos nessa CPI que tende ao Fiasco.

Fazendo uma rápida digressão, interessante mencionar que um Deputado Federal no Uruguai ganha USD 4.500,00/mês, na Argentina ao redor de USD 2.400,00/mês e no Paraguai o equivalente a USD 4.300,00/mês, enquanto os Nobres Parlamentares Gaúchos recebem cerca de R$ 21.000,00 por mês (algo em torno de USD 11.500,00), sem falar nos benefícios e penduricalhos que são parte indissociável do famigerado "Custo Brasil".

Notem que estou comparando o Salário dos Deputados Federais do Mercosul em relação aos Deputados Estaduais do Rio Grande do Sul. Se levarmos em conta o que ganha e custa efetivamente um Deputado Federal no Brasil, o diferença será muito maior.

É fácil entender porque os nossos digníssimos Parlamentares se voltam contra o Mercosul.

Não se ataca a Carga Tributária, as Taxas de Juros e a Burocracia Excessiva porque são as fontes inesgotáveis que permitem a continuidade do "status quo". Sem isso não haveriam os Altos Salários, as Aposentadorias Indecentes e toda uma sorte de benesses.

Dessa forma, é lógico que é muito mais fácil culpar o Mercosul ou a China.

Já pensaram se o Custo do Diesel por aqui fosse o mesmo que a Petrobrás cobra dos nossos Vizinhos? Sabiam que os Postos Petrobrás no Mercosul vendem combustível muito mais barato?

Feito esse rápido desvio e voltando ao tema, são inverídicos e escandalosos os argumentos de que os Vizinhos subsidiam a Produção Orizícola, pelo simples fato de que lá os Arrozeiros ineficientes quebram e os melhores aumentam a sua escala, o que reflete em custos menores por hectare derivados de uma maior produtividade e lhes permite vender mais barato com Lucro.

Os Vizinhos do Mercosul atuam nesse caso como verdadeiras Economias de Mercado. Lá não existe uma "Mãe" CONAB com seus bondosos mecanismos de subsídio direto.

Cada vez que um Político ou uma "Liderança" do Setor Arrozeiro propõe o estabelecimento de Barreiras ao Mercosul estão criando uma enorme confusão ao invés de solução. 

Esse tipo de discussão irresponsável traz consigo um Risco de Retaliação que pode prejudicar concretamente outros segmentos da Economia que geram muito mais Empregos e que exportam produtos de valor agregado bem superiores ao Arroz em Casca.

Essa simples constatação já é motivo mais do que suficiente para rechaçar qualquer vantagem ou artificialidade em favor do Setor Arrozeiro via o estabelecimento de Barreiras à Importação.

Há anos que uma minoria politicamente ultra-articulada do Rio Grande do Sul ganha Fortunas com o Arrendamento de quase 700.000 hectares de Arroz, cobrando entre 30% e 35% da Produção Bruta. Cabe repetir os dados do Censo do Arroz que indicou que 65% da área total é cultivada por Arrendatários.

São esses "Senhores da Terra" que perseguem Subsídios cada vez maiores através dos "Preços Mínimos" fixados pela CONAB. 

São os mesmos que "vendem" a Água do Rio devolvendo-a sem tratamento, que desabastecem cidades na época das Secas, que patrocinam o bloqueio das Fronteiras e que distorcem a realidade dos Custos de Produção.

Ao invés da Assembléia Legislativa do RS prestar serviços para uma Minoria em detrimento da Sociedade, proponho, desde já, que se aproveite a oportunidade da CPI do Arroz para o estabelecimento de uma Agenda Positiva para o Setor Arrozeiro Gaúcho e Nacional.

A seguir descrevo algumas sugestões que podem servir de base para a proposição de Projetos de Lei:

1) Alteração na legislação federal a fim de permitir que os Produtores possam importar diretamente os Insumos aplicados na Lavoura, sem a necessidade de registros e outras travas burocráticas. 

Para se ter apenas uma idéia, enquanto a BASF possui o Monopólio da comercialização do Inseticida a base de FIPRONIL (Standak) e o vende a uma média de R$ 350,00/litro para aplicação na lavoura de Arroz, é possível comprar produto similar na China por USD 30,00/litro (equivalente a R$ 55,00/lt ou 6,36 vezes menos do que o preço atual). Vários outros Insumos utilizados no Arroz podem ser comprados a custos significativamente menores, sem prejuízo da qualidade.

2) Redução da tributação incidente sobre o Combustível utilizado na produção e no transporte de produtos agrícolas;

3) Regulamentação dos Contratos de Arrendamento estabelecendo:

a) Prazos de 8-10 anos a fim de permitir que o Arrendatário possa obter o Retorno sobre o Investimento em benfeitorias, máquinas e implementos;
b) Durante o prazo do contrato, o Arrendatário terá o direito integral sobre a utilização da Terra podendo estabelecer a rotação de culturas, a criação de Gado, etc;
c) Fixação de um Valor Referencial Máximo de 10 Sacos de Arroz/Hectare/Ano, tendo em vista às condições do Solo, a localização da área, as benfeitorias da propriedade, etc.
d) Pagamento anual em Sacos de Arroz, divididos em 4 parcelas nos meses de Maio, Julho, Setembro e Novembro;
e) Cláusula de Opção de Compra Obrigatória em favor do Arrendatário, o qual poderá exercer a opção a partir do pagamento parcelado durante um prazo não inferior a 5 Safras e denominado anualmente em Sacos de Arroz;
f) Possibilidade de retomada imediata do Imóvel Rural em caso de inadimplência de duas ou mais parcelas do Arrendamento Anual.

4) Inserção efetiva no Mercado de Futuros & Opções, adotando os mesmos parâmetros jurídicos da Soja e do Milho;

5) Incentivo ao Uso compartilhado de Máquinas e Implementos Agrícolas para produtores com áreas inferiores a 500 hectares, reunidos na forma de Associação, Condomínio ou Cooperativa;

6) Desoneração Fiscal para novas aplicações industriais;

7) Capacitação dos Pequenos Produtores de Arroz para que migrem a atividade para cultivos de maior valor agregado e melhor segurança em termos de Renda.

Mesmo que venham a ser parcialmente adotadas, esse conjunto de medidas significará um enorme avanço para o Setor e para a Economia do Rio Grande do Sul, melhorando a condição daqueles que realmente produzem Arroz, sem a necessidade de que o País afete as relações com o Mercosul.

Esperamos que o Bom Senso e a Inteligência superem a Mesquinhez e a Incompetência.

Eduardo Lima Porto